sexta-feira, 28 de maio de 2010

Este blog é um espaço aberto a todas as pessoas que, como eu, são apaixonadas por cinema. Sinta-se a vontade para opinar, discutir, sugerir ou apenas deixar um recado sobre o seu momento neste espaço. Essa é a ideia.


Conheça mais sobre Tony de Sousa numa entrevista à jornalista Alda Carvalho.


Quando começou sua paixão por cinema?
Tony - Quando vi os primeiros filmes de mocinho e bandido, especialmente os faroestes. Eu era adolescente na época, na fase de auto-afirmação e queria ser como aqueles caras. Destemidos, persistentes, que sempre vencem no final. Quando assistia aos filmes me transportava para a tela sentindo-me o próprio herói. Demorei a evoluir dessa fase, para uma fase menos alienante, digamos assim, quando comecei a descobrir as possibilidades do cinema com forma de expressão. Foi quando surgiu a paixão definitiva pelo cinema.

- Onde foi dado o primeiro passo para você entrar de vez para esse mundo?
Tony
- Na verdade é uma longa historia que eu narro em um dos meus livros, “O rei do mundo”. Também no livro “Vivendo de cinema” há um resumo dessa história. Mas objetivamente falando, eu tentei inicialmente ir estudar cinema nos Estados Unidos. Eu não gostava de filme brasileiro. Era muito preconceituoso. Tinha visto apenas alguns e formado uma opinião. Eram todos muito mal feitos. Com exceção de um único que havia me agradado. Então quando vi frustradas minhas expectativas de ir para Estados Unidos, fui procurar o diretor desse filme brasileiro que havia me agradado. Chamava-se Roberto Santos. Esse cara foi o primeiro passo para eu entrar para o mundo do cinema. No livro “O rei do mundo” eu conto em detalhes como foi esse encontro.

- É possível sobreviver de cinema no Brasil sem estar ligado aos grandes esquemas tipo Rede Globo e companhia?
Tony - É muito difícil. Eu falo desse assunto na minha tese de doutorado “Vivendo de Cinema”. Viver apenas da produção de filmes de longa metragem de ficção sem estar ligado à televisão ou à publicidade, é quase impossível. Captar recursos pelas leis de incentivo é muito complexo, burocrático e desgastante. Só quem tem uma boa estrutura consegue.

- Para uma pessoa que sonha em tornar-se cineasta nos dias de hoje, qual a primeira dica que você daria?
Tony
- Tem que ter paixão pela coisa. Amar o cinema de verdade. E ser também um pouco racional. Não dá para viver só de sonho. Procurar conhecer todos os aspectos da produção de um filme. Mesmo aqueles que todo mundo acha chato tipo como fazer um contrato, de direitos, de imagem, orçamento detalhado, etc. e ser persistente.

- Como dar o primeiro passo para viabilizar um filme?
Tony - O primeiro passo é um bom roteiro.

- Um bom roteiro parece ser o eixo fundamental de uma produção, mas uma boa ideia basta para se fazer um bom filme?
Tony
- De jeito nenhum. Esse equívoco perdurou e parece que ainda perdura a partir de uma frase atribuída a Glauber Rocha, “uma idéia na cabeça e uma câmera na mão”. O curioso é que o Glauber, em “Deus e o Diabo na Terra do Sol”, um dos seus melhores filmes, na minha opinião, trabalhou com um roteiro super elaborado. Fez inúmeros tratamentos como mostra uma pesquisa da doutora Josette Monzani, professora do curso de imagem e som da Universidade Federal de São Carlos.

- Na sua opinião o cinema nacional está progredindo? Existe algum filme que apresentou algo novo, em conceito, produção ou roteiro?
Tony
- Com certeza. No que se refere à qualidade dos filmes, é possível se perceber esse progresso. O que não mudou muito foi o mercado. Continuamos um país ocupado pelo produto estrangeiro. Vi recentemente, um filme que estreou faz uns três anos, chamado “O Céu de Suely” e gostei bastante. Foi um filme feito com um orçamento pequeno, com uma equipe mínima e um elenco de atores pouco conhecidos. O diretor usou um método parecido com o do cineasta inglês Mike Leigh. Levou os atores para uma locação e ficou vários dias ensaiando as cenas. Maturando os personagens. O resultado é surpreendente. Gostei muito também como o diretor abordou o tema. O filme poderia se mais um sobre nordestinos, jovens e drogas, mas felizmente ele consegue escapar dos clichês.

- Quais as principais dificuldades que os cineastas encontram para filmar?
Tony - Eu acho que a principal dificuldade é a falta de recursos financeiros. E essa falta de recursos financeiros está ligada ao fato dos filmes não se pagarem. Mas isso não é um problema só do Brasil. Em quase todo lugar do mundo levantar dinheiro para fazer um filme não é fácil. O problema é que aqui somos dominados de um lado pelos filmes americanos e de outro pela rede Globo. Sobra pouco espaço para quem sonha em fazer um filme independente, um filme mais autoral, digamos assim.

- A burocracia em busca de patrocínio limita o processo criativo?
Tony - Eu não colocaria a coisa nesses termos. Na verdade, o fato da produção de um filme envolver tanta gente e tantos interesses requer do realizador uma dose de energia exagerada. O cara fica anos tentando viabilizar um filme e depois que o filme está pronto ele precisa fazer um outro esforço fenomenal para fazer o filme chegar ao público. No caso do Brasil, essa questão da burocracia dos órgãos oficiais é outro fator de desestímulo. Eu fiz um filme em 2002 e estou há 8 anos tentando fazer com que o órgão responsável me diga que a prestação de contas que fiz está OK. No meu caso essas coisas me tiram o tesão.

- Qual a importância da internet na vida de quem pretende fazer cinema?
Tony - A internet é importante em todos os aspectos. Todas as novas mídias são importantes para fazer o produto filme circular com mais facilidade. Antigamente só havia as salas de cinema. Era o único espaço onde os filmes eram exibidos. Hoje tem televisão, DVD, internet. Há quem acredite que essas novas mídias irão facilitar a circulação de produtos que até então ficavam restritos a circuitos muito pequenos, enfim, que filmes que não fizeram sucesso irão finalmente ter a sua vez. Eu sou muito cético em relação a isso. Acho que as novas mídias potencializam que o que já é sucesso e o que já está em evidência.

- Investir em curtas-metragens é uma boa iniciativa para iniciar uma carreira?
Tony
- Com certeza. É um bom caminho. Hoje você pode fazer um filminho até com um celular e mandar para o You Tube e fazer sucesso. Mas o aprendizado de todos os aspectos da produção profissional de um filme leva muito tempo. Vale a pena fazer uma boa escola e aprender com profissionais experientes.